24 de jan. de 2016

Um Giro de Notícias, a Questão Ambiental e as Conexões Ocultas

A NATUREZA RECICLA TUDO. Folha no início do processo de decomposição, o qual liberará seus nutrientes para os processos biogeoquímicos dos ecossistemas. Processos complexos também expressam beleza. Foto: Leon Maximiliano Rodrigues
Não é possível crescer indefinidamente. Nenhum modelo teórico ou base de dados sustenta a ideia de um crescimento permanente e eterno. Qualquer sistema tem uma capacidade suporte limitada no tempo e no espaço. A Terra e a sociedade estão inclusas neste raciocínio. Por isso, é chocante perceber que as grandes autoridades do mundo ainda acreditam no “crescimento” como sinônimo de “desenvolvimento”. E que isso deve ser buscado permanentemente a qualquer custo. Trata-se virtualmente de um dogma religioso da sociedade atual.

A busca cega pelo crescimento permanente — da economia, do consumo, da produção, etc. — só leva a um prognóstico bastante óbvio: colapso. Não me surpreenderia se fosse descoberto, daqui a alguns anos ou décadas, que a crise mundial pela qual estamos passando é resultado da busca descontrolada da sociedade pelo crescimento permanente, e que esse talvez tenha sido um dos maiores erros de nossa época.

Não é mais possível negar que, independentemente de regime de governo, tendência política e medidas econômicas, o mundo inteiro avança cada vez mais numa crise sem precedentes. Não trata-se mais da crise do país X ou Y, do governo A ou B. A crise é mundial, é do próprio mercado global. As nações tem seus altos e baixos, mas em média a crise se agrava.

O aumento do consumo das famílias e da qualidade de vida no Brasil nas duas últimas décadas pode ser atribuído a um redirecionamento da economia para as classes mais baixas. Isso, associado ao nosso vasto território privilegiado em termos de recursos, certamente levou ao crescimento econômico e social. Mas isso tem um custo. Nossos recursos naturais estão diminuindo: florestas, fertilidade do solos, minerais, petróleo, etc. Nossa posição vantajosa em relação aos recursos naturais permite uma sobrevida durante a crise. Mas, cedo ou tarde a natureza dará seus avisos de que estamos nos aproximando de um limite crítico. Por outro lado, os limites do manejo econômico já são sentidos, como mostram algumas matérias. Já se fala em recessão no Brasil (1), e a indústria nacional parece dar sinais de arrefecimento (2;3).

Ao vasculhar recentemente as notícias dispersas na internet sobre diferentes temas da atualidade, incluindo as já citadas, fica claro, para os mais atentos, os sinais de que o sistema (o planeta e a sociedade) ajustam-se a esse cenário. Porém, tratam-se de informações dispersas em notícias de diferentes áreas, aparentemente não relacionadas. Tais informações incluem desde o consumo das famílias à opinião de importantes cientistas.

Por exemplo, lá no outro lado do mundo, a China se estabeleceu como a grande potência econômica atual. Mas, seu poder não é infinito. É sim delimitado pela disponibilidade de recursos (naturais) — o espaço talvez seja um fator importante — para serem explorados e transformados em riquezas. Porém, tais recursos vem de um planeta com reservas limitadas e sendo explorado por muitos outros países também bem povoados.

Num país superpopuloso, com uma sociedade altamente consumista — assim como o planeta como um todo —, a tendência é a superexploração dos recursos. Então, cedo ou tarde, a curva de crescimento tem que desacelerar, acompanhando o ritmo da redução e/ou esgotamento dos recursos. Afinal os recursos não crescem como a população e o padrão de consumo. Em matéria do iG São Paulo (4) é destacado que o PIB da China cresceu 6,9% em 2015, sendo a menor taxa de crescimento desde 1990. Essa taxa, segunda a matéria, “ficou um pouco abaixo do esperado pelo governo chinês”. Então é claro que se espera sempre o crescimento. E talvez as menores taxas de crescimento registradas recentemente para o país sejam sinais de que os limites estão se aproximando.

Pode ser isso que acontece com as culturas consumistas mais antigas, como a norte-americana e a europeia. As nações desses dois continentes nunca enfrentaram crises crônicas como a atual, na forma de uma crise coletiva das nações. A China — e outros países, como o Brasil — só estaria seguindo os mesmos passos, porém em ritmo mais acelerado devido ao padrão de consumo atual, o tamanho da população e a tecnologia disponível para exploração dos recursos.

No caso dos padrões de consumo mencionado acima, todos pensam que o ideal é que o poder de consumo das pessoas “aumente”. Existe até um indicador estatística para essa variável: Intensão de Consumo das Famílias (ICF). E existe também, assim como a preocupação com o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) de uma nação, uma preocupação com o crescimento desse índice e de como o Brasil, por exemplo, está em relação a outros países (5). Portanto, a ideia de crescimento esta profundamente enraizada na noção de desenvolvimento e baliza o julgamento sobre o sucesso de um país na busca pelo desenvolvimento.

Caso os padrões econômicos e culturais atuais não mudem, a desaceleração pode ser catastrófica, na forma de um colapso. Essa percepção já inspirou diversas produções cinematográficas. Mas não trata-se de teoria conspiracionista ou paranoia transformada em boa estória. Existe respaldo científico para tal possibilidade, e tem a ver com a “capacidade suporte” dos sistemas ecológicos. Tem a ver também com o conceito de “sustentabilidade” tão alardeado nos discursos políticos e nas mídias de massa, mas muito pouco compreendido. O renomado físico Stephen Hawking comenta em entrevista à BBC que, através do progresso da ciência, o homem cria “formas de as coisas darem errado” (6). Hawking fala sobre a possibilidade de desastre em uma escala de tempo de mil ou dez mil anos. Contudo, salienta que “não vamos conseguir estabelecer colônias autossustentáveis no espaço nos próximos séculos, então temos que ser muito cuidadosos neste período”.

Em outra matéria, a qual expõe especificamente a os quatro possíveis cenários futuros previstos por Hawking — e que inclui um destino trágico para a humanidade devido a problemas com o desenvolvimento de armas nucleares, inteligencia artificial e vírus desenvolvidos em laboratório —, o aquecimento global entre como o fator determinante de um dos cenários possíveis (7). Porém, dentre as quatro vias possíveis para um destino trágico, o aquecimento global parece ser a mais inevitável das alternativas. Hawking destaca que "uma das consequências mais graves de nossas ações é o aquecimento global, causado pelos crescentes níveis de dióxido de carbono resultantes da queima de combustíveis fósseis. O perigo é que o aumento da temperatura se transforme em (um processo) autossustentável, se é que já não está assim".

Entretanto, a grande questão ecológica, e não física, não diz respeito de um possível desastre com a humanidade e da colonização do espaço. A grande questão é que até que algum desastre se configure, as coisas devem piorar gradativamente devido às mudanças climáticas e outros problemas ambientais. A consequência disso é a degradação da qualidade e aumento do custo de vida. Até onde se sabe, já ultrapassamos a capacidade suporte do planeta, como sugere matéria da Planeta Sustentável de 2010 (8). Já ultrapassamos o ponto de virada da curva de equilíbrio entre “crescimento” (do consumo, da economia e da população) da sociedade e a disponibilidade de recursos naturais para sustentar a humanidade. Por isso, é lógico esperar um arrefecimento da economia.

Voltando um pouco mais longe no passado, desde a década de 60 até o período atual, os problemas ambientais evoluíram de problemas locais, como o lixo entupindo uma vala, passando pelas inversões térmicas nos grande centros urbanos, as chuvas ácidas, até o que chamamos atualmente de “mudanças globais”, que inclui não somente as mudanças climáticas, mas muitas outras mudanças, como a degradação sistemática dos solos no mundo inteiro e as novas epidemias, como o zika virus (9) que se proliferam facilitadas pela grande densidade populacional e a mobilidade das pessoas.

Porém, junto com a abrangência dos problemas ambientais cresce a complexidade dos mesmos, sendo os problemas atuais mais difíceis de gerenciar e mais complicados de entender. Por isso, os métodos e estratégias políticas e de gestão tradicionais não são mais suficientes para lidar com as demandas atuais. Assim, muito provavelmente a crise atual exige da mesma forma um novo nível de compreensão e organização por parte dos agentes do poder e da própria sociedade. Esse novo patamar de compreensão e organização deve ser tão abrangente e estruturado como os problemas a serem resolvidos. Nesse sentido Hawking alerta ainda que “é importante garantir que estas mudanças estejam indo na direção certa. Em uma sociedade democrática, isto significa que todos precisam ter uma compreensão básica da ciência para tomar decisões esclarecidas sobre o futuro”.

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