26 de nov. de 2009

Cultura e Sustentabilidade: O Hamas, a Cultura e o Planeta


Leon maximiliano Rodrigues

Há algum tempo atrás recebi uma mensagem de uma amiga. Falava sobre um casamento patrocinado pelo Hamas (Movimento de Resistência Islâmica), facção que governa parte dos Territórios Palestinos correspondentes à Faixa da Gaza, entre Israel e o Mar Mediterrâneo.

O problema é que não se tratava de um simples casamento. Mas, de um casamento simultâneo de 450 casais, no qual a faixa de idade dos noivos era de 25 a 30 anos e das noivas de "menos de dez anos". O título da mensagem é "A Pedofilia dos Hamas". 



Logo surgiram respostas do Hamas tentando mostrar que a informação veiculada na internet, inclusive com um vídeo no YouTube, não era verdadeira. Mas, que as crianças vestidas de noivas eram primas dos noivos, e que seria uma tradição se vestirem de noivas na serimônia. Resposta bastante conveniente...
Atualmente, o Centro Internacional Para Pesquisas Sobre Mulheres estima que existam atualmente cerca de 51 milões de noivas infantis vivendo no planeta. Segundo a mesma instituição, cerca de 30% deste contingente são regularmente molestadas pelos maridos. Além dos Territórios Palestinos, outros países, como a Jordânia praticam tais casamantos. Apesar de ter dificuldade em verificar a confiabilidade das informações acima, não é de se surpreender com o fato a partir da história dos povos daquela região.

Mas, o mapa do casamento infantil é bem mais abrangente. Em certos países da África e Ásia, além do Oriente Médio, ainda ocorre o casamento infantil (ver reportagem de GORNEY, National Geographic, SET/2011).

Esta é uma questão realmente chocante. Entretanto, como dizem os antropólogos, "é preciso relativisar". Ou seja, olhar com os olhos do outro. A cultura muda ao longo do tempo e de lulgar para lugar. Existem várias distorções bossais na cultura humana. Por exemplo, há países em que matar um ser humano devido a uma ofensa é normal e aceitável. Há países em que uma mulher não pode expor sua beleza, e deve ser "totalmente" submissa ao marido, caso contrário, o marido pode espancá-la ou até mesmo matá-la. Há países onde um homem pode casar com um harém, podendo inclusive comprar ou vender suas esposas... Portanto, a cultura varia, e é fruto de processos históricos. A questão é que nós tendemos a ver tudo sob o nosso ponto de vista, e nos chocamos quando nos deparamos com algo radicalmente diferente.


Bom, ... Antes de continuar, gostaria de ressaltar que não defendo o Hamas. Pelo contrário... Mas, não posso deixar de relativisar... e considerar que, para eles, talves o casamento como mostrado na mensagem, possa ser algo normal e eceitável segundo a cultura deles...


Nós, por outro lado, vivemos num país desenvolvido culturalmente em vários aspectos. Rompemos vários tabus, preconceitos, costumes bárbaros e outros. Talvez sejamos favorecidos pela "diversidade". A missigenação de raças e culturas resultou na necessidade de uma cultura mais democrática, que satisfizesse a todas as etnias que aportaram por aqui. O resultado é a tolerância, a democracia, a liberdade, o calor humano e outras virtudes que só encontramos reunidas juntas e em abundância no Brasil. Virtudes essas que certamente estão relacionadas aos conflitos, no bom sentido, entre as diferenças. Porém, as diferenças vêm se dissipando ao longo das gerações. Isso é muito bom, por um lado. Mas, por outro, vemos os valores associados à co-existências das diferenças, ou seja, à diversidade, sendo concomitantemente perdidos, culminando na atual crise de valores tão polêmica e disseminada pela mídia.

Assim como o Hamas e seu povo, pecamos pela nossa cultura. O fato de sermos um país colonizado, sempre nos fez espelhar em uma cultura de fora, sem perceber nossa própria identidade cultural, permitindo que países supostamente mais desenvolvidos fossem gradativamente injetando sua cultura em nós -- Portugal, França, Inglaterra, Estado Unidos... Nunca buscamos entender nossa própria natureza, que é multiétnica. Só recentemente essa característica vem sendo valorizada, muito mais em função de um assédio do Brasil pelo mundo do que por uma consciência própria e autoestima do nosso povo.


Não percebemos "culturalmente" -- essa percepção ocorre, mas restrita a certos setores da sociedade -- a importância do nosso patrimônio cultural e ambiental. Ainda estamos, apesar dos avanços das últimas décadas, tentando nos adequar aos padrões de desenvolvimentos dos países "desenvolvidos". Nunca se questionou tanto a relação do modelo de desenvolvimento econômico e tecnológico vigente com o desenvolvimento sustentabilidade do "ser humano".


Enquanto corremos para conquistar uma cadeira cativa na ONU e lutamos para deixarmos de ser devedor para ser credor, para sermos vistos como país de "Primeiro Mundo", não percebemos que o custo dessa conquista é a nossa dignidade, nossa riqueza verdadeira que são os recursos naturais e culturais. Chegamos a um ponto em que teremos que escolher entre resolver os problemas sociais e econômicos imediatos ou a sustentabilidade da vida (incluindo a humana) e da cultura em longo prazo. E parece que, por enquanto, escolhemos a primeira opção.

Resumindo, o casamento do Hamas é realmento chocante e preocupante. Mas, é um problema cultural e histórico, o qual cedo ou tarde tende a ser resolvido, como a história de outros Países -- inclusive do Brasil -- nos mostra. Porém, a erosão cultura, a erozão da biodiversidade e a degradação dos recursos naturais humanos, como a água e outros, podem conduzir a situações irreversíveis, comprometendo a sustentabibidade da própria vida humana como a conhecemos.

Não quero dizer com isso que devemos nos despreocupar com o casamento infantil e outras aberrações da cultura de certos povos. Mas, entender que a abrangência, a importância e as implicações para o futuro das nossas preocupações. Perceber que um povo aceita (quase)naturalmente o casamento infantil pode significar que o mesmo não está preparado para entender questões como a degradação dos solos e sua implicância para a sustentabilidade da vida das pessoas, Libertar um povo das amarras culturais que dominam os valores e atitudes de um povo, pode significar a libertação desse povo para que dê um passo adiante e passe a se preocupar com questões mais abrangentes e vitais.

Os países onde ocorre o casamento infantil são, geralmente, países pobres e com dificuldades no acesso aos recursos naturais (pelo menos por parcela significativa de sua população). Valorizar demais os padrões e rituais do casamento, como meio para atingir status e posição social direciona os esforços desses povos para questões menos decisivas para suas sobrevivências. E essa postura será fundamental num mundo que se encaminha para a superpopulação, onde o sucesso dos povos será determinado pela "eficiência".

Pensando nas questões locais, penso no que é mais importante: combater o casamento infantil ou os problemas sociais que sustentam ou tornam esse padrão cultural necessário. Considerando um ponto de vista mais amplo possível: a escala planetária, penso que a questão crucial é a decisão sobre se vamos continuar nessa corrida "bélica" pelo desenvolvimento, no mundo da economia virtal monetária, mesmo que o custo seja um planeta no qual a condição de vida chegue à beira do insuportável, ou vamos focar o que realmente é importante: a economia real da natureza.

Bibliografia Consultada

GORNEY, Cynthia. “Jovens Demais para Casar - O Mundo Secreto das Noivas Crianças”. National Geographic, Ed. 138, SET de 2011, p. 66-85. 

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