4 de jan. de 2020

Mais é Menos

Logo do movimento Slow Science (Fonte: RING).

“Nós somos cientistas. Nós não blogamos. Nós não tuitamos. Nós necessitamos do nosso tempo.” (SLOW-SCIENCE.org)

Parece que a avalanche de informações em que estamos imersos atualmente, ao contrário do que se podia imaginar, tem sido um obstáculo para a Ciência. Pelo menos é o que diz a professora Uta Frith, pesquisadora alemã que atua no Instituto de Neurociência Cognitiva da University College London.

Professora Uta Frith (Fonte: LifeWatch).


Segundo Frith (2019), a grosso modo, há muita coisa sem relevância sendo publicada, seja por ser mais do mesmo, seja por ser superficial, sem sólida base metodológica. De fato, há uma grande pressão para que os pesquisadores, em todo o mundo, geram certa produtividade em termos de volume de publicações. Isso tem levado muitos pesquisadores a valorizarem a quantidade de artigos publicados em vez da qualidade de suas publicações.
O resultado é que, ao fazermos um levantamento sobre determinado tema, seja para uma revisão ou para formar a argumentação numa análise dados, encontramos uma quantidade enorme de publicações. Fica difícil filtrar o que é relevante e útil para a pesquisa. E frequentemente ficam de fora referências que poderiam trazer contribuições importantes.
Frith defende o que vem sendo denominado como slow science ― em tradução literal: 'ciência lenta' ― em oposição à fast science ― assim como o fast food está para a alimentação. Trata-se de uma concepção em que o que importa é a qualidade e não a quantidade. Uma boa publicação pode dizer mais que várias publicações ruins. E isso tem muito a ver com a própria Ciência: ‘dizer muito falando pouco’.
De acordo com Fernando Nogueira da Costa (2011), professor Titular do Instituto de Economia da UNICAMP (IE-UNICAMP), o movimento Slow Science defende o direito de cientistas fugirem da corrida pelo grande número de publicações e priorizarem qualidade da pesquisa.

Professor Fernando Nogueira da Costa (Fonte: Terraço Econômico).


Uta Frith não está sozinha. Isabelle Stengers, uma importante cientista e filósofa belga, muito influente nos adeptos da ciência da complexidade, também defende a “ciência lenta”, o que pode ser conferido em sua obra recente “Another Science is Possible: A Manifesto for Slow Science” (Stengers, 2018).
Professora Isabelle Stengers (Fonte: maquiavel)


Há dois problemas com a fast science: (1) a pressão por “produtividade”, tendo como principal critério avaliativo a “quantidade”, tem levado a uma enorme quantidade de artigos e periódicos de baixa qualidade ― os chamados “periódicos predatórios” ― os quais inundam as bases de dados e sistemas de pesquisa em rede; (2) torna-se cada vez mais difícil distinguir entre publicações e autores com credibilidade e duvidosos.
O pesquisador acaba se deparando com um grande trabalhoso desafio, que é a tarefas de buscar suas referências, avaliar o que é relevante e também o que digno de credibilidade e filtrar. Só então poderá reunir as referência que poderá utilizar. Na verdade não é exatamente assim que a coisa acontece. Coloquei dessa maneira apenas para ser didático. Na verdade todas essas tarefas acontecem ao mesmo tempo. Mas, dá para imaginar como o trabalho fica mais difícil e demorado quando temos que lidar com um volume grande de publicações que oferecem muito pouco em termos de informação relevante.
Neste sentido, a Ciência pode se tornar mais inteligente (e eficiente). Assim, mais do que gerar dados e publicações, que resultem em impacto em seus currículos, os cientistas deverão dedicar tempo para analisar os dados e informações visando extrair o máximo de seus estudos e, assim, obter publicações que gerem maior impacto real no conhecimento científico.

Referências

da Costa, F. N. 2011. Manifesto da Slow Science. Blog Cidadania & Cultura.
Frith, U. 2019. Fast Lane to Slow Science. Trends in Cognitive Sciences, 2020, v. 24, n. 1, p. 1-2.
Stengers, I. 2018. Another Science is Possible: A Manifesto for Slow Science. John Wiley & Sons,  Hoboken - NJ, 220p.

Nenhum comentário:

Postar um comentário