Há poucas teorias universais na ecologia e são distantes entre si, mas
é isso que a torna fascinante.
Fonte: LOVEintheSNOW |
Um dos textos do editorial da revista Nature desse ano comenta sobre um debate interessante sobre o estudo de sistemas ecológicos. E ao contrário do que muitos pensam, a Ecologia é apresentada no texto, semelhante a outras grandes áreas do conhecimento, como uma ciência da complexidade. Mas, diferente dos campos mais notórios das ciências naturais, talvez o caminho para estudar ecologia não seja necessariamente a busca por padrões ou leis abrangentes, mas a compreensão do funcionamento único de cada ecossistema. O texto segue em tradução não totalmente literal, e pode conter alguns erros, sem prejudicar a compreensão.
Para alguns cientistas em outros campos, a
ecologia deve parecer relativamente simples. Muitos dos
organismos vivem em uma escala muito humana e são de fácil acesso,
especialmente em ecologia de comunidades. Os ecólogos não precisam de equipamentos
especiais para ver e contar alces. Não há microscópios eletrônicos, telescópios
espaciais ou sondas de perfuração que podem dar errado. É fácil.
No entanto, os ecólogos sabem que seu
objeto pode ser tão problemático como qualquer outro. A Ecologia poderia
ser fácil, se não fosse por todos os ecossistemas – vastamente complexos e variáveis como são. Até mesmo o deserto mais austero ou o pântano
aparentemente menos inexpressivo é uma rede intricada e densa de milhares de
espécies fotossintetizadoras, predadores, animais presas, parasitas,
detritívoros e decompositores. Como o naturalista E. O. Wilson colocou: “Uma
vida inteira pode ser gasta em uma viagem de Magalhães em torno do tronco de
uma árvore.” E nem tudo o que se pode aprender a partir de tal viagem seria
transferido para a próxima árvore. História, acaso, clima, geologia e – cada
vez mais – atividades humanas fazem com que não haja dois ecossistemas que funcionem da mesma maneira.
Os cientistas gostam de impor ordem e
estrutura no caos, e os ecólogos não são diferentes. A Ecologia tem suas
grandes teorias, mas elas estão repletas de cláusulas condicionais, ressalvas e
exceções. Há padrões claros em escalas globais e de uma única espécie, mas o
meio termo é, como o biólogo John Lawton colocou afetuosamente in 1999, “uma
confusão”. É duvidoso que as generalidades que fundamentam os padrões complexos
da natureza serão sempre formuladas de maneira sucinta o suficiente
para ajustar-se a um molde.
Esta complexidade é demonstrada pelo
trabalho que questiona uma famosa e elegante ‘cascata trófica’ no Parque
Nacional Yellowstone, Wyoming (EUA) (discutido na pág. 158 desta edição da Nature). A teoria diz que os
lobos, reintroduzidos no parque nos anos 1990 após décadas de ausência, expulsam os alces para longe de certas áreas. Isso tem um efeito dominó para o
resto da cadeia alimentar, permitindo o florescimento da faia preta e o
salgueiro após décadas sendo pastejadas quase até à morte. Mas estudos em anos
recentes sugerem que os lobos sozinhos não controlam o ecossistema. Outros
fatores – a presença de represas de castores e ursos pardos, meteorologia, caça
por humanos e até mesmo mudanças climáticas – também afetam a população de alces
e o crescimento de árvores e arbustos.
Seria útil ter padrões gerais e comuns em
Ecologia. Saber como os ecossistemas vão responder às mudanças climáticas, ou ser
capaz de prever as consequências da introdução ou reintrodução de uma espécie,
tornaria a conservação mais efetiva e eficiente. Mas, uma teoria unificada para tudo não é o único meio para adquirir conhecimento.
Mais ecólogos devem abraçar o lado não
preditivo da sua ciência. Desvendar o que está acontecendo em sistemas
complexos pela observação de como ecossistemas evoluíram e pela manipulação do
ambiente em experimentos, é uma ciência tanto quanto a criação de fórmulas para
descrever como ecossistemas trabalham.
Mudanças de paradigmas, afinal, são raras em
Ecologia. Os debates são frequentemente resolvidos quando conceitos
concorrentes combinam, e não quando um empurra o outro completamente para fora
da mesa. Considere as idéias contrastantes de regulação ‘top down’ dos
ecossistemas por carnívoros e a regulação ‘bottom up’ pela nutrição disponível
a partir de plantas. Há um trabalho lento na direção de uma teoria integrada
para prever quando o ‘topo’ vai governar e quando a ‘base’ será responsável – e
esta teoria vai levar algum tempo para considerar os jogadores do meio, os
herbívoros.
Outros debates ecológicos tem seguido um
caminho similar. A discordância sobre se os ecossistemas complexos são mais ou menos
estáveis que os mais simples, por exemplo, também está se acomodando em um
consenso: depende.
Predições práticas úteis não precisam derivar
de leis universais. Em vez disso, podem vir de um conhecimento profundo do funcionamento
único de cada ecossistema – conhecimento adquirido pela observação e análise. Existem
propostas de teorias abrangentes, mas se os ecólogos querem produzir
trabalho útil para a conservação, podem fazer melhor ao passar seus dias
sentados calmamente em ecossistemas com seus cadernos impermeáveis e lentes
de mão, escrevendo tudo.
A complexidade ecológica, a qual pode
parecer como um emaranhado de detalhes impenetrável, é a fonte de
grande parte de nosso prazer na natureza. Se os ecossistemas fossem quebra-cabeças
simples que trabalham todos da mesma maneira, perderiam muito de seu mistério, surpresa e beleza. Muitos trabalhos de conservação visam proteger a
complexidade e variabilidade que tornam os ecossistemas tão difíceis de se
entender e, de fato, de conservar.
As regulamentações ecológicas não são as únicas
razões para promover a conservação e combater as extinções. Às vezes podemos
argumentar para a conservação de uma espécie particular porque a ecologia fornece
uma base científica para isso. Outras vezes, construímos o argumento
porque há uma boa chance de que a Ecologia logo irá alcançar e explicar porque
as espécies são importantes.
Mas, mesmo que alguns predadores façam
pouco ao se assentarem no topo de suas pirâmides alimentares, selecionando
alguns herbívoros, realmente queremos viver em um mundo sem eles? Responder a
essa pergunta é realmente fácil.
Texto original em: Nature. Editorial, v. 507, n. 7491, p. 139-140, 13 March 2014, doi:10.1038/507139b. Disponível em: <http://www.nature.com/news/an-elegant-chaos-1.14849>; Acessado em: 20/03/2014.
Tradução: Leon maximiliano Rodrigues
Tradução: Leon maximiliano Rodrigues
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