8 de set. de 2019

O que Falta para Enchergarmos?

Cientistas tentaram calcular os benefícios que os insetos produzem. Trilhões deles polinizam cerca de três quartos de nossas colheitas, serviço que chega a valer 500 bilhões de dólares por ano. E esse é apenas um dos incontáveis e insuspeitos serviços oferecidos pelos insetos e pela biodiversidade do planeta (Crédito da imagem: MATT DORFMAN_BRIDGEMAN IMAGES; Fonte: Jarvis, 2019).
Olhamos mas não vemos. Ouvimos falar, mas não entendemos. O que realmente significam as mudanças globais sobre as quais ouvimos tanto falar nas mídias?

A Ciência está perplexa com o que está acontecendo com o planeta. Não podíamos imaginar que éramos capazes de tamanho feito. Causar a "sexta extinção em massa" parecia um feito tão grande que só uma catástrofe cósmica, como no provável evento da extinção dos dinossauros, podia fazê-lo.

No entanto, mostramos sermos capazes de ir bem além. Não só estamos causando uma grande extinção em massa, como estamos moldando a face do planeta Terra de uma forma que supera todas as outras forças naturais que talharam a superfície do planeta por toda a história da vida na Terra.

O que mais espanta nesse processo é a velocidade com que estamos fazendo isso. Mudanças nos ecossistemas e na biosfera são medidas em escalas de milhares ou milhões de anos. A humanidade está conseguindo fazer uma mudança completa no planeta em apenas alguns séculos. Mas, se considerarmos apenas as últimas 5 ou 6 décadas, é possível constatar uma transformação na superfície do planeta sem precedentes na história natural da Terra.

No entanto, o que falta para que a sociedade como um todo, e as autoridades em particular, consigam perceber e reagir ao que está acontecendo? Kevin Gaston (ver texto do link), professor de biodiversidade e conservação da Universidade de Exeter (Inglaterra) nos dá uma pista: “Os seres humanos parecem ter uma melhor capacidade inata de detectar a perda completa de uma característica do meio ambiente do que de notar sua mudança progressiva.”

Talvez as pessoas mais velhas percebam que algo mudou. Que já não vemos tantos vagalumes à noite, ou que já não vemos tantos insetos voando entorno das luzes dos postes à noite. Ou ainda que já não pescamos peixes tão grandes e em abundância como antes, precisando nos contentar com espécies menores que antes eram despresadas nas pescas de fim de semana. Contudo, as gerações mais novas não percebem isso porque já nasceram e cresceram num mundo com menos insetos, peixes e outros seres vivos. Assim, as mudanças graduais na biosfera não são percebidas de uma geração para outra. E temos a sensação de que tudo continua normal.

O ecólogo (e não 'ecologista', como coloca o tradutor do texto de Brooke Jarvis) Brad Lister, especialista nos trópicos reforça essa percepção, como mostra o texto de Jarvis (ver link):  "Na última visita feita a floresta seguia 'atemporal' e 'fantasmagórica', com 'suas cascatas e tapetes de flores'. Só um especialista notaria que faltava algo ali. ... as perdas conduzirão a floresta a um ponto crítico, depois do qual 'haverá uma perda dramática do sistema da floresta tropical', e as mudanças se tornarão óbvias para qualquer um. O lugar que ele tanto ama se tornará irreconhecível."

O texto (ou a tradução) comete um pequeno erro. A sexta extinção em massa não é "a sexta vez na história da humanidade", mas a sexta vez na história do planeta. Porém o erro não diminui a dimensão do problema. Certamente algumas espécies sobreviverão ao processo de extinção em massa, como sempre aconteceu. E provavelmente o ser humano estará entre elas. Mas, sobreviver não é o suficiente. Precisamos viver e prosperar. Entretanto, tudo indica que não teremos garantia de que isso será possível. Como Jarvis coloca em seu texto, "consolar-se com a sobrevivência de uns poucos animais simbólicos é ignorar o valor da abundância, de um mundo natural que prospera com base na riqueza, na complexidade e na interação".

Sem a abundância e diversidade de espécies, a Biosfera perde sua capacidade de autorregulação, de auto-organização e de manutenção da estabilidade climática e tantos outros serviço que oferece para a sociedade, permitindo à humanidade prosperar.

A mudança que estamos impondo ao planeta já transgrediu alguns limites importantes, reconhecidamente a da perda de biodiversidade, das mudanças do clima e do ciclo do nitrogênio (Rockström et al., 2009; Steffen et al., 2015). Um estudo publicado em 2018 nos 'Proceedings of the National Academy of Sciences' mostra que a biomassa ou peso dos mamíferos é de 96% composto de humanos e de animais de criação (domésticos); apenas 4% são de animais selvagens. Somos portanto o componente animal dominante na Biosfera, seja pela influência direta ou indireta, através dos animais que criamos.

É por isso que o termo "Antropoceno", cunhado para denominar uma nova época geológica, ganha cada vez mais força e reconhecimento na comunidade científica. Já o cientista naturalista Edward O. Wilson, um dos maiores cientistas em atuação, sugere outro nome: “Eremoceno” (a era da solidão).

Mas, por que precisamos tanto preservar a Natureza e suas espécies? Um fenômeno na China, no vale do condado de Maoxian, fornece indícios de nossa dependência da biodiversidade. A escassez de insetos polinizadores naquela região exigiu a contratação de trabalhadores humanos para substituir as abelhas, a um custo diário de até 19 dólares por trabalhador. Cada pessoa faz de cinco a dez árvores por dia, polinizando manualmente flores de macieira. As abelhas e outros insetos faziam o mesmo serviço de graça e com mais eficiência.

Então, o que falta para reagirmos?... Ou melhor, o que precisamos para desencadear uma reação da humanidade à destruiçào que ela própria está causando ao sistema da Terra, do qual depende tanto? Os alertas tem sido dados regularmente pela comunidade científica e pelo movimento ambientalista. O primeiro alerta já foi dado há mais de meio século atrás, pela bióloga Rachel Carson, através de sua obra "Silent Spring" (Primavera SIlenciosa), de 1962, na qual denunciou a morte dos passaros pelos agrotóxicos, os quais recém ahvia surgido no mercado.

Referências:
Jarvis, Brooke. O Apocalipse dos Insetos. Piauí - Questões Ambientais, Ed. 151, ABRIL de 2019 (Tradução de Sergio Tellaroli)
Rockström, J., Steffen, W., Noone, K., Persson, Å., Chapin III, F. S., Lambin, E. F., Lenton, T. M., Scheffer, M., Folke, C., Schellnhuber, H. J., Nykvist, B., de Wit, C. A., Hughes, T., van der Leeuw, S., Rodhe, H., Sörlin, S., Snyder, P. K., Costanza, R., Svedin, U., Falkenmark, M., Karlberg, L., Corell, R. W., Fabry, V. J., Hansen, J., Walker, B., Liverman, D., Richardson, K., Crutzen, P. & Foley, J. A. 2009. A safe operating space for humanity. Nature, 461(7263): 472–475.
Steffen, W., Richardson, K., Rockström, J., Corell, S. E., Fetzer, I., Bennett, E. M., Biggs, R., Carpenter, S. R., de Vries, W., de Wit, C. A., Folke, C., Gerten, D., Heinke, J., Mace, G. M., Persson, L. M., Ramanathan, V., Reyers, B. & Sörlin, S. 2015. Planetary boundaries: guiding human development on a changing planet. Science, 347(6223):1259855.

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